segunda-feira, 11 de abril de 2011

Crítica: MEMÓRIAS DE UMA GUEIXA

Publicado originalmente no site A ARCA no dia 24/01/2006

O trabalho definitivo de Zhang Ziyi!

Por Emílio "Elfo" Baraçal

Meditando... concentração... controle sua respiração, Elfo... você precisa escrever uma crítica sobre esse filme... ok, é um filme complicado para você, mas... isso... meditando...

(olha para o cartaz do filme antes de entrar na sala de projeção... respira fundo e dá o primeiro passo)

Olha, já vou avisando: não li o livro. Sim, Memórias de uma Gueixa é baseado em um romance de sucesso lançado em 1997, escrito pelo americano Arthur Golden. E pretendo me redimir do pecado de não ter lido esse livro o mais breve possível. E por dois motivos: pra mim, que não li o livro, adorei o longa. E lógico, quem costuma acessar A ARCA regularmente, sabe que sou um entusiasta da cultura oriental.

Em primeiro lugar, devo avisar uma coisa. Este filme pode provocar alguma polêmica, dependendo de quem o assiste. Creio eu que há três tipos de públicos para essa produção. 1 - Quem não manja nada de cultura japonesa. 2 - Quem ama cultura japonesa (como eu) e 3 - Quem é japonês de verdade.

Se você não entende patavinas de cultura japonesa, mas gosta de películas que mostrem culturas diferentes, curte um romance, um drama cheio de reviravoltas, não vai ter do que reclamar. Se você é um entusiasta da cultura japonesa, pode ser que ache um ou outro defeito, mas creio ser difícil. Agora, se você é japonês (ou morou muuuuuuito tempo no Japão), pode ter um pouco da mesma reação de boa parte do povo da terra do sol nascente.

O que acontece é o seguinte: o filme é sobre gueixas, certo? Lá no Japão, reclamaram do fato de terem escalado, para dois dos papéis principais, duas atrizes chinesas, Zhang Ziyi (de O Clã das Adagas Voadoras) e Michelle Yeoh (de O Tigre e o Dragão). Sabe como é, japoneses e chineses não se bicam (reza a lenda... ou não, já que pode ser um fato), mas não é só isso não. Os japoneses podem até ter um tantinho de razão. É como se fossem filmar um filme sobre um jogador de futebol brasileiro e escalassem (olha o trocadilho aí!) um ator argentino para o papel. Ou se fosse sobre samba. Qualquer um pode dançar, mas só o brasileiro terá o gingado e a levada precisa para se tornar realmente natural.

É aí que fica o lance da coisa: será que a interpretação delas, o modo como encarnaram o papel de gueixas foi convincente? Se você nada sabe sobre cultura japonesa e menos ainda sobre este misterioso mundo das mulheres do entretenimento, se tiver algum erro, vai passar batido. Apenas divirta-se. Agora, se você é um entusiasta... pode ser que ache alguma coisa, embora eu ache difícil. Eu mesmo, não achei nada de errado nos maneirismos delas que, na minha sincera opinião, foram perfeitos. Agora se você é japonês... bom, tire suas conclusões, afinal, você tem autoridade para isso.

Em questão de interpretação, é díficil dizer quem foi melhor entre as duas. É muito fácil se identificar com a personagem de Ziyi através de cada emoção com a qual a atriz nos presenteia. Yeoh é igualmente competente nesse quesito (embora eu tenha ficado pendendo pro lado de Ziyi). Porém, Yeoh tem um probleminha: suas características étnicas são muito mais evidentes do que as de Ziyi. O rosto de Yeoh simplesmente não se encaixa no meio das atrizes japonesas. Porém, se você é da turma do "japonês, chinês e coreano é tudo igual!", não esquente a cabeça e curta o filme. Porém, se você é um entusiasta como eu, pode estranhar. Se tu for japonês então...

Ainda assim, há uma atriz que simplesmente engole Ziyi e Yeoh quando aparece em cena. E esta atriz é a maravilha do oriente chamada Gong Li (de Lanternas Vermelhas e Adeus Minha Concubina). Toda vez que ela dá as caras, não importa que emoção passe, raiva, cinismo, alegria, ódio, sedução, não importa: ela derruba qualquer um nessa película. Ou talvez não.

Entre os homens, quem mais se espera que se destaque é Ken Watanabe (de O Último Samurai e Batman Begins), não? Errado. Watanabe está muito bem. Mesmo. Entretanto, para azar dele, há ali no meio um ator chamado Koji Yakusho (é dele o papel principal do filme japonês que inspirou o longa americano Vamos Dançar?, com Richard Gere). A maior prova disso é a cara que ele faz quando Ziyi está dançando para todos em um palco. Sim, a mesma cena que vemos no trailer, onde flocos brancos caem sobre Ziyi no meio do escuro, onde a única fonte de luz incide sobre ela. Preste atenção no rosto de Yakusho e verá sobre o que estou falando.

A direção deste longa ficou por conta do aclamado Rob Marshall, do musical Chicago. E que trabalho o cara fez: dá pra notar que ele tomou cuidado em relação a quase tudo. Cenários (deslumbrantes - tanto é que eu queria morar no cenário do jardim do Barão, um dos personagens), enquadramento, música (que por sinal, é do mestre John Williams, que consegue mais uma vez fazer o clima do filme entrar na alma de qualquer um com seu trabalho), figurino, edição, quase tudo feito de forma primorosa e cuidadosa. Você deve estar se perguntando o porque de eu ter citado "quase tudo" duas vezes, não? O defeito que mais me incomodou na produção foi o fato de eles terem preferido a interpretação em inglês ao invés do idioma usado ser o japonês. Se os atores são japoneses em sua maioria, por que isso? As interpretações de todos com certeza ficariam ainda muito melhores se fosse na lingua nativa deles (ou algo próximo, no caso das atrizes chinesas). Uma pena que tenham optado dessa forma.

É uma adaptação fiel do livro? Mais uma vez, digo que não o li, então não posso dizer se o longa é merecedor de comparação ao trabalho original, mas o roteiro escrito por Robin Swicord é bem amarrado, cheio de reviravoltas e possui humor sutil nos momentos certos e é cheio de drama e romance. Mas o mais legal de tudo é que me fez torcer pela personagem de Ziyi e me fez odiar a personagem de Gong Li.

O mundo das gueixas é muito bem retratado, mostrando seus costumes, seu dia-a-dia, seus códigos (como por exemplo, as gueixas não têm o direito de poder amar alguém), o modo como influenciavam os bastidores da política e da alta-sociedade japonesa, entre outros detalhes. Fiquei bastante impressionado como todas essas características foram apresentadas de forma balanceada, sem um sobressair ao outro.

Bom, agora, que tal irmos para a história de "Memórias de uma Gueixa"? Pouco antes de ocorrer a 2ª Guerra Mundial (a história chega a atravessasr este fato histórico), uma menina, Chiyo (a adorável Suzuka Ohgo, impossível não gostar dela) é vendida por sua família a uma casa de gueixas como escrava. Sua irmã mais velha sofre o mesmo destino, mas é vendida para uma outra casa de gueixas que não se sabe onde fica. Dessa forma, não aceitando este fato, Chiyo quer, de qualquer forma, reencontrar a irmã.

Entretanto, uma coisa em Chiyo chama muito a atenção: ela tem belos e inesperados olhos azuis. Sendo assim, a senhoria que administra a casa de gueixas pensa em fazer a menina se tornar mais uma fonte de lucro. Porém, a maior gueixa dessa casa (e uma das mais disputadas da região), a egoísta, cruel e belíssima Hatsumomo (Gong Li) fica com inveja de Chiyo justamente pelos olhos azuis da menina, enxergando nela uma ameaça ao seu status. Claro que a maldita faz de tudo para tornar a vida de Chiyo um inferno (embora comparada às outras mulheres da casa, a vida de Chiyo não era muito diferente).

Triste, acontece algo na vida de Chiyo que dá a ela a motivação perfeita para se tornar uma gueixa. Sendo assim, ela corre atrás do tempo perdido. Hatsumomo, ao mesmo tempo que tenta fazer Chiyo desistir desse tipo de vida, precisa acabar com sua maior rival na região, a bela e requisitada Mameha (Michelle Yeoh), de uma casa de gueixas rival. Porém, Mameha vê um futuro promissor em Chiyo e faz negócios com a senhoria dela. Assim, Mameha se torna a nova mestra da menina na arte do entretenimento e da sedução conforme os anos passam (e claro, Ziyi interpreta a versão mais velha de Chiyo).

No meio disso, o caminho de todas elas cruzam com um homem que é conhecido apenas como "O Presidente" (Ken Watanabe), chamado assim por ser o cabeça de uma das maiores empresas da região. Seu melhor amigo é Nobu (Koji Yakusho), um companheiro de trabalho que odeia gueixas. E é com esses dois que o destino de Chiyo (que é rebatizada como Sayuri no meio do caminho) será traçado, resultando numa história bela e poética.

Resumindo, um filmaço, pelo menos para mim. Se você só está acostumado a assistir coisas com toneladas de efeitos especiais e com "nominhos da moda" no meio do elenco e mais outras coisas do gênero que em boa parte são vazias, vá assistir a "Memórias de uma Gueixa". É bom variar de vez em quando. Pode ser que você não goste, afinal, não é um filme de ação. Agora, se você gosta da cultura japonesa, não perca tempo. E se você é um japonês... ah, sei lá!

:: ALGUMAS CURIOSIDADES 

- Steven Spielberg, Brett Ratner, Spike Jonze e Kimberly Peirce foram alguns diretores que foram sondados para dirigir este filme. Spielberg acabou ficando apenas com a produção.

- Maggie Cheung, uma das atrizes de Herói, foi considerada para o papel de Mameha. Já pensou, rapaz? Nooooooossa, eu ia ficar louco... não que não tivesse ficado com a Michelle Yeoh, mas pô... é a Cheung!

- Levou muito tempo e muitas negociações para que Rob Marshall dirigisse este filme. Desde que ele dirigiu o grande sucesso "Chicago", ele havia negociado com a Miramax que iria dirigir um filme produzido por esta empresa. Porém, "Memórias de uma Gueixa" é da Dreamworks. Como sempre teve uma histórinha por trás dos bastidores de que uma produtora fica "roubando" talentos da outra é que desandava tudo.

- John Williams desistiu de compor a trilha sonora de Harry Potter e O Cálice de Fogo para vir trabalhar na trilha deste filme. E ele, na minha humilde opinião, fez muito bem, já que o que ele ia fazer no bruxinho seria, mais uma vez, uma variação de seu primeiro trabalho com a série de filme de Harry Potter. Claro que ele ia querer algo mais original depois de três filmes, não?

- Os riquixás (aquela carroça puxada por um homem, uma espécie de "táxi") são os mesmos que foram usados em "O Último Samurai". Porém, foram levemente modificados para se adequar melhor à época desta produção, que é posterior aos acontecimentos do épico com Tom Cruise.

- As atrizes passaram por um "curso-relâmpago" de um mês e meio de como se tornar uma gueixa.

Memórias de uma Gueixa (Título original: Memoirs of a Geisha) / Ano: 2005 / Direção: Rob Marshall / Roteiro: Robin Swicord / Inspirado no best-seller de mesmo nome escrito por Arthur Golden / Elenco: Zhang Ziyi, Michelle Yeoh, Ken Watanabe, Gong Li, Koji Yakusho / Duração: 145 minutos.


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Comentários Atuais:

Faria o texto com menos parêntesis. Quanto à estrutura do texto, creio que continua ótimo. Acredito que este é um texto do qual me orgulho e não precisa de alterações radicais.

Quanto a ter lido o livro Memórias de Uma Gueixa para fins de comparação, posso dizer que já o li, mas quero deixar comentários sobre o livro pra um futuro artigo onde dissecarei o livro e também farei finalmente a comparação com o filme.

Um comentário:

  1. Gostei da sua crítica, embora discorde apenas da língua falada. Particularmente acho o japonês muito feio de ser ouvido. hahaha
    Eu li o livro e é bastante fiel. Claro, o livro é zilhões de anos luz melhor, mas o filme é excelente, delicado e traz um contexto histórico, cultural muito legal. Vale a pena. Parabéns!

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